Cantou, Angélico Vieira: "É engraçado como a vida nos prega, partidas. Quanto mais fortes pensamos que somos, caímos em armadilhas...". E isto, retrata tão bem a minha vida neste ano.
É engraçado, como somos capazes de nos tornar personagens da nossa própria vida. Como conseguimos confundir aquilo que pensamos querer, aquilo que pensamos ser correto, o que achamos que esperam de nós, com aquilo que queremos e precisamos verdadeiramente.
Desde que a minha identidade foi descoberta, há cerca de um ano, que tenho calado muitas coisas que gostaria de ter mencionado aqui. Dúvidas que tive em determinados momentos, medos, angústias... Mas, uma vez mais, pensei que pessoas do meu dia-a-dia ficariam a saber demasiado da minha vida e usar isso contra mim e então, optei por me calar. Optei por manter a fachada. A personagem que criei para mim. Aquela que fazia o esperado, o politicamente correto. A aparência de uma relação feliz. Os pseudo-projetos, planos futuros, desejos de casamento, filhos. A realização pessoal e profissional. O amor-próprio, quando tudo isto é uma grande hipocrisia.
Uma grande hipocrisia porque, algures no meio disto, perdi-me. Perdi-me e esqueci-me de quem fui, de quem queria ser. Deixei-me enrolar pela personagem e afoguei-me. Dei-me tanto e recebi tão pouco. Mas fiquei. Porque, vamos ser sinceros... "Eras a única encalhada e fracassada na tua família". Era assim que eu via, pelo menos. Deixei as minhas falhas, os meus erros toldarem o meu discernimento. Deixei que todas as vozes que me avisaram que eu não seria capaz, e como efetivamente não fui, levassem a melhor. Esqueci-me de ler, esqueci-me de procurar. Esqueci-me de querer sempre mais e melhor. Meia fraca, mas houve sempre uma voz em segundo plano. Dizia-me constantemente que "tu mereces mais", mas a vontade de não falhar novamente era tão grande que levei tudo até às últimas consequências. Conformei-me às minhas próprias dúvidas.
São agora visíveis os danos. Aqueles, que me provoquei conscientemente. E ter a noção disso está a ser a maior onda de todas. Aquela que quase me levou. Saber que fui eu e só eu que infligi isto a mim própria pelo meu desejo estúpido de agradar a toda a gente.
Finalmente consegui parar. Observar. "Stop and stare. I think I'm moving but I go nowhere...". E eu estava mesmo a ir a lado nenhum. Nenhum positivo, pelo menos. Perdi a minha individualidade, a minha essência. Aquilo que me faz ser quem sou. Respirar. Tão simples, tão necessário, tão colocado em último lugar. Tão bom! Ver o mundo com os mesmos olhos mas agora com mais cor. Apreciar os pequenos prazeres da vida. Trocar a viagem de carro e ir a pé. Sentir o vento a lavar e levar esta personagem de mim. Recuperar-me, recompor-me.
Não é um processo fácil e muito menos rápido. É doloroso e nem todos os dias são alegres. Por vezes, a necessidade de carinho, atenção alheia torna-se demasiado alta. Alta ao ponto de criar confusão na nossa mente, questionar tudo: o que foi feito, o que nos trouxe até aqui.
Demorei, mas cheguei. "Wake me up when it's all over (...) all this time I was finding myself and I... Didn't know I was lost...". Sei agora que estive. Mas vou deixar de estar.
Que este texto ajude, quem como eu, em algum momento se perdeu:
Sempre tive uma grande dificuldade em manter amizades. Manter, porque trava-las, é facílimo.
Por vezes, cruzam-se na nossa vida pessoas com características tão semelhantes às nossas que dizemos quase sem dúvidas que será uma amizade longa. Chamar a esta ligação amizade ou mesmo de longa, vai variar das considerações de cada um. Porque em diferentes contextos, diferente medidas, sempre assim será. Infelizmente, sou bastante seletiva naquilo que trago para a minha vida: seja na escolha de roupa no shopping, nas palavras que uso e com quem, nas atitudes e nomeadamente nas pessoas. É por tudo isto que tenho um vasto leque de amizades.
Não acreditem, estou a mentir.
Não pensem com isto que sou um qualquer bicho, que não gosto de me relacionar, conviver e tudo o mais. Simplesmente, a minha seletividade não ajuda neste campo. Porquê? Porque ao contrário da maioria, é para mim muito complicado confundir conhecidos com amigos. Há uma diferença ENORME no meu ponto de vista. Uma opinião que vai gerar sempre conflito. Não sou capaz de chamar amigo a um colega de trabalho. Não sou capaz de chamar amigo a uma pessoa que acabei de conhecer. Muito menos consigo chamar amigo a alguém só porque é amigo de um amigo meu. No caso da família, por exemplo: dou-me super bem com a minha irmã, que é também uma amiga. Será que a ligação de sangue se sobrepõe à amizade? Quero dizer, em primeira instância eu refiro-me a ela como minha irmã, não como minha amiga...
Segundo a Wikipédia, a palavra "amizade" baseia-se numa relação afetiva, geralmente não-romântica, entre duas ou mais pessoas. Guiando-me pela definição, uma parte de mim acha que estou certa quanto a este assunto. Mas... Será que a sociedade em geral, cria ligações afetivas com toda a gente que vê nem que seja uma só vez?
Como já foi dito anteriormente, o Carnaval não é de todo uma celebração que me deixe necessariamente com vontade de me mascarar. Acho que em toda a minha vida, assisti a quatro ou cinco cortejos, mas nada de execional. Aqui na Alemanha o Carnaval é, aparentemente, das celebrações mais importantes do ano. Milhares de pessoas saem à rua para ver o desfile e comemorar esta data. Há um bocadinho de tudo: desde crianças a pessoas de idade, homens e mulheres, tudo com uma alegria tão grande que chega a ser contagiante.
Não chegámos no início, porque entre atrasos alheios à minha pessoa, os transportes também não ajudaram muito sendo que estão um caos, entre muitas linhas que nem sequer circulam para evitar atrasos e problemas ao tão aclamado cortejo.
As pessoas interiorizam o Carnaval de tal forma que uma semana antes andam mascarados, nomeadamente com aqueles pijamas fato-de-macaco da Primark, a coisa que mais se viu por aí!
Nesta primeira fotografia, vemos habitantes locais vestidos a rigor!
Há música de todos os tipos e feitios: a de fundo, que sai das colunas previamente colocadas em bastantes pontos das ruas como sons de tambores, flautas e pessoas a cantar.
O meu pai disse que este ano, o tema do cortejo seria o acontecimento histórico da América: Trump. Não sei onde ele terá visto tal informação porque, vi bastantes carros e nenhum deles tinha sequer a mínima semelhança com o assunto. Achei no entanto imensa piada a este, pelo contexto económico que vivemos e ver que em vez de se lavar roupa, lava-se dinheiro. Aparentemente é uma figura mítica de cá, mas que a mim, claro está, não me diz nada.
Os veículos carnavalescos, não sei se era uma piada, ou se era real, mas que vi esta informação em mais que um, vi. Só podem circular a 6 km hora. Os desgraçados!
E a parte melhor deste cortejo é: lançamento de doces! Isso mesmo - doces! Chocolates miniatura, rebuçados, gomas em formato mini, tudo aquilo que possam imaginar. Entre muita gulimisse que consegui apanhar, apanhei também um dos momentos de lançamento.
Ao meu lado, estava um rapaz de cadeira de rodas. Apesar da deficiência física, pareceu-me ter todas as capacidades mentais. Aquando a queda dos chocolates, ele só olhava, com alguma tristeza sem os poder apanhar. Alguma coisa em mim me fez partilhar o que apanhei com ele, que me agradeceu num gesto tão instintivo e com um sorriso tão genuíno que compensou totalmente!
Depois, como disse, desde miúdos a graúdos tudo fez parte do cortejo. A senhora de idade que tive oportunidade de fotografar, fez me soltar um leve sorriso, por ver que aqui, todos aderem de forma igual sem vergonha ou receio do que os outros vão pensar.
No geral, gostei do cortejo. Tirei uma carrada de fotografias das quais só aproveitei um terço, apanhei e comi doces, fiz uma boa ação e vim para casa contente. Achei uma boa iniciativa e muito provavelmente nos próximos anos, já verei o Carnaval com outros olhos!
Aqui os ordenados são pagos entre 13-15 de cada mês. Assim, coincidiu com o intervalo em que estive em Portugal. Como organizada que sou, fui fazendo as contas ao meio mês de Janeiro que trabalhei, e sabia portanto mais ou menos quanto ia auferir.
Vi o valor no dia em que fui embora mas como não me pareceu de longe o correto, decidi esperar até voltar para entretanto confrontar com o recibo das horas que havia de receber. Sabia que era paga a 10€ à hora (brutos). Pareceu-me mais que bom! No entanto, neste valor está incluído tudo o que podem imaginar: subsídio de alimentação é uma delas. O chamado 13º mês, aqui não existe! Achei estranho mas se o valor é tão alto, para quê reclamar. O meu pai já me tinha avisado que por não ter filhos e não pagar renda, ia descontar bastante.
Tal como já acontecia em Portugal, pensei. Pois bem, não. É muito mais!
Sabem quanto é que uma pessoa solteira e sem despesas aparentes desconta aqui?
Uns maravilhosos 16% minha gente, 16! Estou incrédula, verdadeiramente.
Ah, e fora mais umas taxaszinhas que vêm sempre por acrescento!
Conclusão: se vos oferecerem 2000€ no estrangeiro não se iludam nem achem que o valor é muito alto, porque destes, só vão receber perto de 1500€. Têm uma renda de 700€ para pagar, 50-100€ pela recolha de lixo (valores variam de zona para zona e pelo numero de pessoas), 200€ para contas (não inclui televisão, que é obrigatório pagar nem Internet, que é opcional. Só e apenas água, luz e gás), perto de 100€ pelos transportes, fora tudo o que seja de alimentação.
Compensa? Eu, na minha modesta opinião, acho que não.
Ontem, entrou uma cliente no restaurante que reconheci. Uma cliente da sapataria. Decidi não abordar o assunto por ter receio de uma eventual pergunta complicada de responder, até que ela...
- Oh menina, bem me parecia que estava a conhece-la. Então, está tudo bem consigo? Já não trabalha na sapataria? Ou trabalha nos dois lugares ao mesmo tempo?!
- Sim, está tudo bem. Não, já saí agora estou só aqui.
- Oh que pena, gostei tanto daquelas sandálias que me vendeu no verão-
- Aquelas prateadas?
- Sim, sim. Usei, usei e vou voltar a usar! Adoro! Realmente já não a via há muito tempo por lá, mas pensei que andava por outras lojas.
- Sim, andei por uns tempos mas saí no mês passado.
- Pronto, são opções não é? Cada um sabe de si!
- É isso, gosto em vê-la, até uma próxima!
Sabia desde o momento em que a vi entrar que a conhecia. Sabia perfeitamente das sandálias que ela falava. Foi talvez das clientes mais queridas que tive o prazer de atender durante todo aquele ano. A mesma, é enfermeira, e já me tinha reconhecido no hospital quando tentei dar sangue a última vez. É bom sentir que, apesar de opiniões superiores contrárias, alguém 'gostou' de ti o suficiente para te recordar onde quer que te veja.