Sinto que as pessoas aqui são civicamente mais educadas.
Os lugares reservados a pessoas deficientes físicas ou motoras, são para as mesmas. Não há nenhum otário a parar nem a estacionar lá como é tão recorrente ver-se em Portugal. As pessoas, principalmente as crianças, e aí é que entra todo o meu espanto e admiração: se chegar alguém carregado ou uma pessoa idosa, os mesmo são os primeiros a levantar-se e a ceder o lugar que ocupavam até então, nem que para isso tenham que ir em pé uma carrada de tempo! Sabem a frequência com que via isto acontecer em Viseu? Se pensar bem, talvez 1/1000. Há toda uma cordialidade entre os meios de transporte fascinante, uma boa organização no trânsito, nada de protestos, muito menos buzinadelas! São todos muito mais relaxados e felizes!
São situações que tenho presenciado e me têm agradado bastante, principalmente por ver que a geração que se segue, ainda tem qualquer coisa de útil naquela cabeça. Ainda há pais que sabem dar os valores base aos seus filhos. E eu que já quase nem tinha esperança de voltar a dizer isto!
Desde bem pequenas, que os nossos pais nos ensinaram todas aquelas regras básicas que estamos fartos de ouvir. Não manusear facas, não mexer no fogão sem adultos por perto, não ir nem falar com estranhos e sobretudo, não lhes abrir a porta.
Abrimos a porta, seja no prédio, seja no apartamento, umas duas vezes em cada trinta. Não só pelos ensinamentos prévios, mas pelo facto de o nosso intercomunicador ser bastante eficaz e nunca ouvirmos a resposta de quem se encontra do outro lado.
Contou-me a minha Maria mais nova, o que se tinha passado no serão de domingo, enquanto cá em casa se preparavam para jantar, e eu me encontrava a trabalhar. Tocaram à campainha, no apartamento. Diz a minha irmã que era uma criança, a pedir para cantar as Janeiras. Não sei porquê, e acho que nem ela própria sabe, mas abriu a porta. Foi então que se deparou não só com uma criança, como também com um homem adulto de raça negra, a fumar, com o maior dos descaramentos. A minha irmã diz que pensou em adverti-lo para o caso, mas sorriu para o miúdo, como eu provavelmente também teria feito. Quando foi a última vez que alguém falou em cantar as Janeiras?! E quando deu por ela, estava o homem debruçado na ombreira da porta, segundo ela, com aquela "cara depravada de pedófilo", passo a expressão, e o miúdo voltou a perguntar se podia cantar as Janeiras. Entretanto, o homem vira-se para ela e pergunta-lhe:
- Está tudo bem contigo?
A minha irmã, que já devia estar apavorada, limitou-se a perguntar-lhe se a conhecia de algum lado. O miúdo volta a insistir se podia cantar as Janeiras, ao que a minha irmã se limita a dizer que não, depois de ter sido sugerida a entrada no apartamento. Ao que o homem responde por fim, mais palavra menos palavra, que era ela que perdia.
Estou atónita, nem sei bem o que dizer quanto ao assunto. Será que fizeram o mesmo nas portas dos nossos vizinhos? Será que alguém os deixou entrar? Como é que uma coisa destas pode acontecer?! Usarem uma criança para convencer alguém a abrir uma porta, fazer-se de porco nojento quando vê que é uma miúda que abre a porta?! Em que mundo estamos?
Só prova a minha mania de fechar sempre a porta quando entro ou saio do prédio, olhar constantemente para trás quando ando à noite sozinha na rua, não abrir a porta a ninguém que não se tenha anunciado previamente. Isto é assustador. Verdadeiramente assustador. Nem quero imaginar o que a minha Maria deve ter sentido naquele minuto que deve ter demorado horas...
Ainda não passei por ela, mas será que existe algo melhor?
Ontem tive a oportunidade de ver uma bebé lindíssima, nascida há pouco mais de dois dias, de uma das minhas ex-colegas mais queridas, com quem tive o prazer de privar na sapataria. A bebé é a coisa mais doce, mais perfeitinha que já vi. Tão frágil que até dá medo de pegar, e tão querida que derrete qualquer coração.
Desde bem cedo que penso que quero passar pela experiência. Talvez por ter cá em casa o melhor exemplo que podia ter. Talvez por ter tanto orgulho na minha mãe, que espero algum dia alguém se poder orgulhar assim de mim.
Sou muito crítica em relação a tudo o que me rodeia. Tenho o defeito de ver defeitos, se é que assim se pode chamar... Diariamente uma nova situação. O que falo hoje é apenas um pequeno pormenor, um simples aspeto. Olho para as crianças e sinto que o futuro está seriamente comprometido. E de quem é a culpa? Dos pais. Exclusivamente dos pais. Aposto agora que esses mesmo pais me vão cair em cima. Vão dizer-me que sou uma miúda que nada sabe da vida e/ou que quando for mãe, também não vou gostar de ouvir uma 'fedelha' fazer estas afirmações. De qualquer das formas, mantenho o meu ponto de vista.
Eu fui criança. Fui criança no verdadeiro sentido da palavra. Andei de baloiço, corri, caí, esfolei-me, trepei árvores, puxei cabelos, entre tantas outras coisas. Traduzido a miúdos: tive infância. E o que é que as crianças têm hoje? Tecnologia. Computadores, telemóveis e tablets, tudo o mais moderno possível. E isto acontece porquê? Simplesmente porque os pais têm perguiça. Perguiça de os aturar. Perguiça de lhes transmitir valores, de os ensinar. É tão mais fácil comprar-lhes tudo sem se preocuparem com nada.
E sabem o que me dói mais? Saber que estas crianças nunca saberão o que é ter infância. Nunca saberão o que é ter infancia porque não sabem o que é brincar...